segunda-feira, 14 de maio de 2012

Como descobri o ladrão de marmitas




Não sou de tomar partido.
Prefiro ficar à margem das coisas que não me dizem respeito.
Quando pedem minha opinião sobre esse ou aquele assunto, mesmo que seja polêmico, não tenho medo de ser sincero.

Mas não espere me encontrar discutindo minha opinião ou a dos outros. Opinião e bunda todo mundo tem. Mais ou menos: tem gente que não tem bunda.
Não tomo partido principalmente no trabalho, onde os “colegas” têm a obrigação de serem simpáticos e agradáveis, aceitando a cor, o credo, o modo de vestir, o time do coração, a posição política ou a orientação sexual de todos.

Alguns administram isso melhor do que outros, mas é possível ver nos olhos desse ou daquele o desconforto disfarçado quando dizem “- Pois não?” ou “- Obrigado.” ou “- Cada um cada um, não é?”.
Imagine se pudéssemos falar para quem trabalha conosco o que realmente pensamos deles? Ou, melhor ainda, o que gostaríamos de fazer com eles?

Quem gosta de falar tem que estar preparado para ouvir, e poucos tem a noção dessa regra fundamental para o bom relacionamento, principalmente em um ambiente onde estamos juntos por necessidade e não por prazer.
Por isso, como já disse, não me envolvo. Porém, de mais ou menos um mês para cá alguns fatos ocorridos no meu trabalho me levaram a tomar uma posição.

Começou em uma tarde de segunda-feira. Estava enchendo minha garrafa com água – supostamente – potável do filtro do corredor quando ouvi duas mulheres do meu departamento conversando.
“- Roubaram a marmita da Maria!”
“- Qual Maria?”
“- A Maria, aquela moça nova, da nossa recepção...”
“- Roubaram a marmita dela?”
“- Não, a marmita inteira, não.”
“- Então, roubaram o quê?”
“- Roubaram... ”

Minha garrafa acabou de encher e não quis que percebessem minha atenção. Voltei para minha mesa sem ouvir a conversa toda.
A empresa onde trabalho fica em uma região distante da cidade e seu entorno é desprovido de boas opções para almoço. Assim, coloca à disposição dos seus funcionários um restaurante, uma lanchonete e um café. E distribui vale-alimentação para todos.
As pessoas que quiserem trazer sua própria refeição podem utilizar a geladeira e o microondas disponíveis nos pequenos refeitórios, dois por andar, um em cada lado do prédio.

Nunca pensei em fazer isso; acho a comida do restaurante e os lanches da lanchonete bastante razoáveis.
No dia seguinte a colega da baía defronte da minha, analista como eu, voltou nervosa do almoço. Não lhe perguntei o que havia acontecido, é claro, mas, curioso, deixei o som desligado, ficando apenas com os fones nos ouvidos. Ela estava furiosa e desabafava com o colega ao seu lado:
“- Era só o que faltava! Fui almoçar e quando abri minha marmita, o ovo mexido tinha sumido!”
“- Omelete?”
“- Não! Ovos mexidos... Roubaram! Você acredita?”
“- E o resto da marmita?”
“- O resto? O arroz com feijão, a berinjela e as batatas?”
“- É!”
“- Deixaram lá.”
“- E você comeu?”
“- Claro que não!”

Liguei o som novamente e a música que tocava na rádio era “Real Man”, do Bruce Springsteen: “... To some smooth talkin' cool walkin' private eye...”.
Naquele mesmo dia, já encerrado o expediente, no elevador, ouvi duas estagiárias comentando que o roubo das marmitas não era novidade. Estavam preocupadas.
“- Imagina. Se abrem sua marmita para roubar a mistura, podem muito bem não roubar nada e deixar algo lá.”
“- Verdade. Alguém já reclamou com a segurança?”
“- Parece que falaram com a secretária do diretor.”
“- Será que ela vai falar com alguém?”
“- Duvido!”

“Ela tem razão!” – pensei. A última pessoa da qual se deve esperar alguma providência é a “secretária do diretor”. Aliás, qualquer pessoa próxima a qualquer diretor evita a todo custo comunicar problemas a seu chefe. Talvez seja um dos motivos de diretores estarem sempre sorridentes, aparentando não terem nada para resolver.
Passei na padaria e comprei queijo e presunto. Em casa descongelei dois filés de frango, hidratei um pouco de shitake seco e com esses ingredientes preparei um rolê de frango.
Procurei no armário e achei um monte de caixinhas de plástico, não usadas desde que fui casado, anos atrás.
Tupperware, é como são chamadas. “Tupperware, entupeware, anywhere” deveria ser o slogan disso. “Por que será que sempre há mais caixas do que tampas?”, indaguei.
Consegui encontrar a tampa da mais transparente entre as caixas e com ela fiz minha marmita, colocando o rolê de frango coberto com molho branco e acompanhado de algumas batatas sautê.

No dia seguinte coloquei-a em um lugar visível na geladeira, junto a um monte de outras marmitas. Fiquei espantado com a quantidade delas. Não imaginava que tantas pessoas trouxessem a própria refeição.
O refeitório fica aberto até as 14:00h. Consegui almoçar somente às 13:30h, morto de fome, esperando não ter sido a vítima da vez. Encontrei minha marmita intocada e saciei o apetite.
Naquela noite preparei outra receita: medalhão de filé mignon ao molho madeira, acompanhado de risoto de alcachofra. Fazia tempo que não cozinhava com tanta motivação.

Não fui almoçar muito tarde na quinta-feira. Se estava em uma investigação, pensei, precisava observar as pessoas que almoçavam naquele refeitório onde os eventos aconteceram para tentar encontrar, dentre elas, alguém que levantasse suspeitas.
Nos dia seguinte levei novamente “meu rango”, desta vez um mexido de ovos que aprendi a fazer no Ponto Chic.


(....)


Mais em Dicas sobre nada, do grande amigo Capitão Ócio.










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